segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Filha querida: João Candido cria diário

Diário em rede social faz 'arquelogia da saudade' e revela a grandeza do amor entre pai e filha

Foi uma tragédia que causou comoção nacional. No dia 23 de março, Maria Candida Portinari, 16 anos, linda, jovem e inteligente, neta do pintor Candido Portinari, entrou na banheira de casa, no Rio de Janeiro, e não saiu mais do banho. Um vazamento de gás a intoxicou. Foi fatal.
“Em vinte minutos, a vida de minha filha estava perdida. E a minha também”, diz hoje João Candido, pai de “Pinguinha” e único filho do grande pintor que Brodowski revelou para o mundo.

Foi muito doloroso também para Maria Edina Portinari, mãe da menina. João e Maria se uniram, então, para superar a tragédia pessoal e familiar.

Para um homem de notoriedade internacional, mentor do megaprojeto Guerra e Paz, que trouxe os painéis de Portinari de volta para o Brasil, este foi também um momento de pausa forçada.
João Candido interrompeu o trabalho de divulgação do pai e do Projeto Portinari para buscar, em todos os lugares, mas principalmente dentro de si mesmo, resquícios, mensagens e pedaços da filha ausente.

Diário aberto
É aí que entra a rede social. João Candido passou a postar no Facebook um diário que chamou de arqueologia da memória. Ou arqueologia da saudade.

Recuperou arquivos, fotos, vídeos, filmes, cartas, desenhos e lembranças da filha para postagens generosas, em que dividiu, com os amigos, mensagens, sensibilidades e declarações de Maria Candida, a sua “Pinguinha”. “Fiz isso pela necessidade de extravasar uma dor absurda, impensável”, conta ele, por telefone.

Na verdade, foi também a forma que João Candido encontrou para manter Pinguinha viva e apresentá-la a centenas de seguidores de sua página pessoal no site de relacionamentos. E, também, de sobreviver, aos 74 anos, apesar do desespero e da saudade.
Entre as mensagens que recebeu estava a de um suicida que desistiu de se matar. A morte da menina fez com que ele percebesse o valor da vida.

Repercussão
A cada postagem, dezenas de amigos e também de gente desconhecida que passou a acompanhá-lo nestes 140 dias de dor, dão o alento necessário para que ele siga.

Esses amigos virtuais postam músicas, flores.. Até dos Estados Unidos vem mensagens “in box”, um canal de comunicação fechado, com psicografias de cartas que trazem a assinatura da filha.
Professor e PHD em matemática, homem de formação racional, João ainda não tem certeza se as manifestações são legítimas.

Mas se emociona com experiências que teve ao lado de espiritualistas, entre eles o ator Carlos Vereza, em que sentiu fortemente a presença da filha. “Foi uma corrente de amor que se formou”, diz, comovido.
O lado racional, no entanto, ainda é muito forte: “Não preciso de intermediários para falar com minha filha”, diz.

Andanças
De fato, João e Maria tem buscado e encontrado Pinguinha em toda a parte. Em casa, em Madri, em Cascais e Lisboa, em Paris e também em Assis. Foram experiências fortes, relatadas no Facebook, em que sinais muito claros evocaram a presença dela.
Maria Candida está também do carro de João.
“Hoje mesmo, assim que liguei o rádio, a voz de uma criança cantava Alecrim Dourado...”
Era esta a música que Pinguinha cantava pequenininha. Alguém duvida?

Cinzas e comunhão
No dia 31 de julho, quando Maria Candida completaria 17 anos, João e Maria Portinari reuniram em casa os amigos de escola da menina.

O padre que batizou Pinguinha foi chamado para rezar uma missa na casa do condomínio em São Conrado.

Fizeram então, numa cerimônia tocante, a dispersão das cinzas de Pinguinha. Na hora da Eucaristia, João Candido, que nunca foi católico praticante, levantou-se para comungar, num impulso irresistível. A mulher o deteve: “você não pode, não fez primeira comunhão!”, lembrou Maria.

Ao que o padre respondeu: “Pode sim, venha, João Candido! Você vai fazer sua primeira comunhão agora”.

Fonte: Jornal A Cidade - Rosana Zaidan
http://goo.gl/ZdLyPw


quinta-feira, 1 de agosto de 2013

Casal antecipa casamento para que filho com leucemia possa participar
Menino de 2 anos já perdeu rim e médicos deram semanas de vida.
Pais terão cerimônia de casamento no próximo sábado nos EUA.

Um casal da Pensilvânia, nos Estados Unidos, resolveu antecipar em cerca de um ano seu casamento para garantir que seu filho de 2 anos que sofre de leucemia possa participar da cerimônia e fazer o papel de padrinho do pai. A cerimônia será realizada neste sábado (3).

Logan Stevenson, de 2 anos, é filho de Sean Stevenson e Christine Swidorsky. Em tratamento contra a leucemia e outras complicações, o menino já teve um dos rins retirados e tem uma massa no remanescente.

Na semana passada, médicos disseram que o menino teria mais duas ou três semanas de vida. “Queremos Logan nas nossas fotografias de família, e queremos que ele veja seu pai e sua mãe se casando”, afirmou Christine.



Fonte: G1
01/08/2013

terça-feira, 23 de julho de 2013


'Saiu inteira ele. Só os dedos do pé são meus', diz professora de Curitiba.
Ela precisou ir à Justiça para o procedimento; decisão foi inédita no país.



“Estou feliz, realizada. Estou completa”, afirma a professora Katia Lenerneier, de 41 anos, dois anos após o nascimento da filha Luíza Roberta, que foi gerada com o sêmen do marido morto. Katia tentava engravidar quando o marido descobriu que tinha um tipo agressivo de câncer de pele, em fevereiro de 2009. Juntos, decidiram guardar o sêmen em uma clínica, a -200°C. Pouco tempo depois, ele morreu aos 33 anos.
Como Katia não tinha a autorização escrita do falecido marido, precisou recorrer à Justiça para conseguir o direito ao procedimento. O caso, inédito no país, foi aprovado em maio de 2010 e, no mês de setembro, a professora engravidou. A menina nasceu em junho de 2011 com quase três quilos, emocionando a família e a equipe médica.
“Só alegria”. É assim que Katia descreve a vida depois de ser mãe. Para a professora, a decisão de engravidar com o sêmen do falecido marido foi um acerto. “Não tenho nenhum arrependimento ou sentimento de culpa por ela não ter o pai”. A professora conta com a ajuda da mãe para cuidar da menina.

A mulher optou em trabalhar meio período para ter mais tempo de ficar com a criança que começou a ir para a escolinha no início de 2013. Ela diz que a família do falecido marido tem contato direto com Luíza Roberta. “Minha sogra é bem presente”.

Alegria da vovó
“Era o que ele queria. Se estivesse vivo estaria muito contente”, afirma a dona de casa Maria de Lourdes Niels, que é avó de Luíza Roberta e mãe do falecido marido de Katia. A neta é motivo de felicidade para a dona de casa. “É uma alegria que não dá nem para falar. Ela é especial. É uma coisa que só Deus é que sabe”.
Maria de Lourdes lembra que ela e família apoiaram a decisão de Katia de fazer inseminação artificial com o sêmen no marido já morto. “Minha família deu grande apoio para ela. Sei que ela é uma boa mãe. Confiei muito na pessoa dela. Ela é uma pessoa muito boa”.

“Eu fico encarando as fotos dela [Luíza Roberta] para matar um pouco da saudade dele. As fotos dele eu não consigo ver porque dói muito. A morte é muito triste, ninguém aceita”, relata a dona de casa.

Novo rumo
“Às vezes, dá um aperto no coração por ele não estar curtindo, vivendo, vendo esses momentos bonitos. Isso pesa, mas é durante um minuto. No outro minuto já descontraio”, explica a professora. Depois da inseminação artificial, Katia ainda deixou o que sobrou do sêmen do marido e dois óvulos dela congelados. Porém, no fim de 2012, ela resolveu eliminar o sêmen e, agora, vai doar os óvulos. “Não me vejo mais grávida. É muito difícil não ter uma pessoa para te ajudar emocionalmente e financeiramente, não ter um companheiro”, avalia.

Ao observar a filha, a professora diz que a garota é bastante parecida com o pai. “Saiu inteira ele. Só os dedos do pé são meus”, brinca. Não apenas fisicamente, Katia também atribui a personalidade do marido à filha. “Ela é bravinha. Levanta a sobrancelha igualzinha a ele”.
Para a mulher, a criança trouxe um novo rumo à vida. “Acabou um ciclo e começou outro. Ela resgatou um pouco dele e, ao mesmo tempo, deu outro rumo para a vida”, finaliza Katia.

Fonte: G1.com.br/pr/parana
08/07/2013

 

quinta-feira, 18 de julho de 2013


A arte de cuidar dos enfermos
28/06/2013

Nos últimos anos tenho trabalhado de forma aprofundada a categoria do cuidado especialmente nos livros Saber Cuidar e O Cuidado Necessário (Vozes). O cuidado mais que uma técnica ou uma virtude entre outras, representa uma arte e um paradigma novo de relação para com a natureza e com as relações humanas, amoroso, diligente e participativo. Tenho tomado parte de muitos encontros e congressos de operadores da saúde com os quais pude dialogar e aprender, pois o cuidado é a ética natural desta atividade tão sagrada.

Retomo aqui algumas idéias referentes às  atitudes que devem estar presentes em quem cuida de enfermos seja em casa seja no hospital. Vejamos algumas delas entre outras.
Compaixão: é  a capacidade de colocar-se no lugar do outro e sentir com ele. Não dar-lhe a impressão que está só e entregue à sua própria dor.

Toque da carícia essencial: tocar o outro é devolver-lhe  a certeza de que pertence à nossa humanidade. O toque da carícia é uma manifestação de amor. Muitas vezes, a doença é um sinal de que  o paciente quer se comunicar, falar e ser ouvido. Quer identificar um sentido na doença. O enfermeiro ou a enfermeira ou médico e a médica podem ajudá-lo a se abrir e a falar. Testemunha uma enfermeira: “quando te toco, te cuido; quando te cuido te toco; se és um idoso te cuido quando estás cansado; te toco quando te abraço; te toco quando estás chorando; te cuido quando não estás mais podendo andar”.

Assistência judiciosa: O paciente precisa de ajuda e a enfermeira ou o enfermeiro deseja cuidar. A convergência destes dois movimentos  gera a reciprocidade e a superação do sentimento de uma relação desigual. A assistência deve ser judiciosa: tudo o que o paciente pode fazer, incentivá-lo a fazer  e assisti-lo somente quando já não o pode fazer por si mesmo.

Devolver-lhe  a confiança na vida: O que o paciente mais deseja é recuperar a saúde. Dai ser decisivo devolver-lhe a confiança na vida: em suas energias interiores, físicas, psíquicas e espirituais, pois elas atuam como verdadeiras medicinas. Incentivar gestos simbólicos, carregados de afeto. Não raro, os desenhos que a filhinha traz para o pai doente, suscita nele tanta energia e comoção que equivale a um coquetel de vitaminas.

Fazê-lo acolher a condição humana. Normalmente o paciente se interroga perplexo: “por que isso foi acontecer comigo, exatamente agora em que tudo na vida estava dando certo? Por que, jovem ainda, sou acometido de grave doença”? Tais questonamentos remetem a uma reflexão humilde sobre a condition humaine que é, em  todo o momento, exposta a riscos  e à vulnerabilidades inesperadas.

Quem é sadio sempre pode ficar doente. E toda doença remete à saúde que é o valor de referência maior. Mas não conseguimos saltar por cima de nossa sombra e não há como não acolher a vida assim como é: sadia e enferma, bem sucedida e fragilizada, ardendo por vida e tendo que aceitar eventuais doenças e, no limite, a própria morte. É nestes momentos em que os pacientes fazem profundas revisões de vida. Não se contentam apenas com as  explicações científicas (sempre necessárias), dadas pelo corpo médico mas anseiam por um sentido que surge a partir de um diálogo profundo com seu Self  ou da palavra sábia de um parente, de um sacerdote, de um pastor ou de uma pessoa espiritual. Resgatam, então, valores cotidianos que antes sequer percebiam, redefinem seu desenho  de vida e amadurecem. E acabam tendo paz.
Acompanhá-lo na grande travesia. Há um momento inevitável que todos, mesmo a pessoa mais idosa do mundo, devem morrer. É a lei da vida, sujeita à morte: uma travessia decisiva. Ela deve ser preparada por toda uma vida que se guiou por valores morais generosos, responsáveis e benfazejos.

Mas para a grande maioria, a morte é sofrida como um assalto e um sequestro, gerando sentimento de impotência.  E então dá-se conta de que, finalmente, deve se entregar.

A presença discreta, respeitosa de alguém, da enfermeira ou do enfermeiro ou do parente próximo ou da amiga, pegando-lhe a mão, susurrando-lhe palavras de conforto e de coragem, convidando-o a ir ao encontro da Luz e ao seio de Deus que é Pai e Mãe de bondade, podem fazer com que o moribundo saia da vida sereno e agradecido pela existência que viveu.

Sussurar-lhe ao ouvido, se possui uma referência religiosa, as palavras tão consoladoras de São João: Se teu coração te acusa, saiba que Deus é maior que teu coração (3,20). Pode entregar-se tranquilamente a Deus cujo coração é de puro amor e de misericórdia. Morrer é cair nos braços de Deus.
Aqui o cuidado se revela muito mais como arte que como  técnica e supõe no agente de saúde densidade de vida, sentido espiritual  e um olhar que vai para além da morte. Atingir este estágio é uma missão a que o enfermeiro e enfermeira e também os médicos e médicas devem buscar para serem plenamente servidores da vida. Para todos valem as sábias palavras: “A tragédia da vida não é a morte, mas aquilo que deixamos morrer dentro de nós enquanto vivemos”.

Leonardo Boff é autor de Vida para além da morte,  Vozes 2012.

sábado, 13 de julho de 2013

O Instituto Entrelaços se orgulha de seus parceiros e colaboradores.
E com muito prazer recebe Dra. Silvana Aquino na equipe de assistência as atividades clínicas.

A Dra. Silvana Aquino é Mestre em Sexologia e Especialista em Sexualidade Humana pela Universidade Gama Filho. Especialista em Psicologia Oncológica Professora de Ensino superior da Sociedade Educacional Fluminense e Psicóloga da Unidade de Cuidados Paliativos do INCA.

Agora, além de ministrar cursos no Instituto Entrelaços, ela também realizara atendimentos às segundas e sextas.

Seja bem vinda!

Instituto Entrelaços
Rua Sorocaba, nº 477, sala 202 - Botafogo
(21)2530-4137 e (21)7954-3131

segunda-feira, 8 de julho de 2013

A Família Enlutada : Sobrevivendo a perda de um filho





A Família Enlutada : Sobrevivendo a perda de um filho
Erika Pallottino



Uma das perdas mais difíceis, que aciona níveis de sofrimento nunca antes imaginados e provoca profundo desequilíbrio no sistema familiar, podendo provocar reações de luto complicado, é a morte de uma criança.

A morte de um filho envolve a perda dos sonhos e das esperanças dos pais. É como perder o futuro. De todas as perdas, a da criança, é a que produz mais efeitos diferenciais sobre a reação da família.


Walsh e McGoldrick (1998), afirmam que de todas as experiências humanas, a morte coloca os desafios mais dolorosos para as famílias. Especialmente, as crianças, desempenham papéis fundamentais na família e suas mortes perturbam todo o equilíbrio e sistema familiar.


O processo de luto, destaca Kovács (1992), evoca sentimentos fortes e, por vezes, ambivalentes necessitando de tempo e espaço para a sua elaboração. A ocorrência da perda de uma pessoa significativa tem uma potencialidade intensa de desorganização, as ações do cotidiano ficam tingidas por esta situação. E assim, com a morte de um filho, o potencial complicador do luto, fica ainda mais evidente ao risco psíquico.

O luto familiar não surge em seguida à morte do filho, mas tende a apresentar-se continuamente frente às perdas e dores inerentes ao tratamento oncológico. Um processo que acompanha a trilha do tratamento, angustiando, antecipando e vivendo, por vezes, na iminência da morte do filho


O luto, para a grande maioria das famílias, tem início no momento em que o diagnóstico é comunicado. Ao longo do tratamento são observadas reações de luto, tais como: sensação de entorpecimento, irritação, fadiga, descrença, períodos de apatia alternados com atividade intensa e agitação, entre outros.


A desorganização emocional do sistema familiar também é um sintoma comum. Muitos pais apresentam grande dificuldade em absorver as informações passadas pela equipe de cuidados. De forma ansiosa tentam entender o que se passa com o filho, porém, a dificuldade de concentração e o empobrecimento da atenção e foco faz com que no minuto seguinte, grande parte do que foi dito seja esquecido, podendo prejudicar a comunicação com os demais membros da família e, em alguns casos, recebendo a cobrança por notícias.


A fragilidade e vulnerabilidade emocional de um dos progenitores é ponto a ser considerado no trabalho com famílias enlutadas. O luto antecipatório familiar deve funcionar como um alerta sobre os complicadores do processo de luto. A percepção e atenção de como as perdas ao longo do tratamento estão sendo vividas antes da morte, a expressão de sentimentos ambivalentes e de culpa que permeiam o vínculo e o cuidado com a criança, são pontos fundamentais a serem considerados e cuidados, junto aos pais que se encontram com seus filhos em iminência de morte. A dor de quem sobrevive a uma perda tão significativa como a de um filho, pode ser insuportável, desestruturante e avassaladora para o funcionamento psíquico, sendo fundamental a atenção a todas as expressões e intensidades do pesar.


Importante considerar dentre os membros das famílias, os irmãos, os filhos sobreviventes. Estes são profundamente afetados pela perda e morte do irmão doente. Bowlby (2004), ressalta que grande parte das perturbações observadas entre os filhos sobreviventes resulta mais das modificações no comportamento dos pais com relação a eles do que de qualquer efeito direto que a morte pode ter exercido sobre as próprias crianças.

Pais enlutados apresentam dificuldades em seu processo de vinculação, disponibilidade afetiva e ambivalência no cuidado dos filhos saudáveis. Dependendo da idade que estes se encontram, profundos registros e marcas psíquicas se originarão. Um cuidado esvaziado, apático, sem tom amoroso, implica consequências emocionais futuras.

Pensando a família enquanto unidade de cuidado, apontamos as tradições e ritos familiares, próprios e específicos de cada configuração familiar, como potência elaborativa e de grande valia para os membros enlutados. O ritual autoriza o sofrimento, favorece e facilita a sua expressão, marca a vida de quem morreu, honrando sua história. A possibilidade de ritualizar ajuda a família na busca de sentido para a sua perda. O ritual, portanto, é promotor de equilíbrio interno.


Vale a ressalva que em famílias grandes ou pequenas, a perda nunca é coletiva, mas individual. Isso quer dizer que a perda de um filho ressoa de forma singular em cada progenitor, em cada irmão, em cada tio ou tio, em cada avô ou avó. Perde-se uma criança na subjetividade de cada membro da família. Essa criança ocupa um lugar único para cada um. Portanto, a expressão do luto, bem como a duração do processo, irá ocorrer a partir do rompimento do laço afetivo que existia em cada uma dessas relações. 


Hoje, acredita-se na orientação do trabalho do luto a partir da busca de reconstrução de significado. Falamos na possibilidade do encontro de sentido e de significado na vida do sobrevivente. Pensando à família enlutada, em sua reconfiguração, reordenação e readaptação sem o filho, faz-se mister a busca deste sentido. Seus membros, profundamente enlutados, terão que reconstruir uma identidade, idealmente, junto de pessoas significativas, a partir de um enfrentamento assimétrico, oscilante entre luto e dor e restauração e refazimento. Nesse vai e vem, entre dor e restauração, nesse contínuo de dinâmica subjetiva e afetiva, é possível ocorrer a construção de significado e elaboração do luto. Dessa forma e ao seu tempo, o trabalho de luto pode acontecer. A família pode ir se refazendo, apaziguando a ausência, transformando a dor em memória, tornando o amor e a saudade em laço continuado, em afeto permanente.




Referências Bibliográficas:



BOWLBY,J. Perda: tristeza e depressão. 3ed. São Paulo: Martins Fontes, 2004.

KOVÁCS, M.J. Morte e desenvolvimento humano. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1992.

WALSH,F,; MCGOLDRICK, M; Morte na família: sobrevivendo às perdas. Porto Alegre: ArtMed,1998;


terça-feira, 11 de junho de 2013


O Instituto Entrelaços está abrindo mais duas turmas para o curso
"Cuidados Paliativos - UMA INTRODUÇÃO",
Para participar, solicite seu formulário de inscrição através do e-mail comunicacao@institutoentrelacos.com e envie preenchido até o dia 30/06/2013.

São apenas 8 vagas por turma. Inscreva-se já!

sexta-feira, 31 de maio de 2013


NÃO EXISTEM PACIENTES TERMINAIS

As palavras portam sentidos que mal nos damos conta. Outras vezes, possuem marcas de um tempo que já se foi. Ainda existem pessoas que “discam” um número ao usar o telefone quando na verdade os telefones possuem apenas teclas a algum tempo.

Mas esse texto não irá seguir nenhum caminho obscuro da etimologia para surpreender o leitor com atavismos, alguns até cômicos. Quero ressaltar outras formas de obscuridade. Por exemplo, raramente os pacientes morrem nos hospitais. Eles vão a óbito. Aliás, todos nós sairemos de um hospital quando internados, e o ato de sair é alta hospitalar. Existe até “alta por óbito”.

No reino das precisões técnicas, dominado pelas terminologias que recortam a realidade e nomeiam tudo, torna-se necessário dizer as coisas de forma que só os iniciados saibam os sentidos mais “verdadeiros”. Dessa forma, quem está morrendo de fato não está morrendo. Chamar essa pessoa de moribunda parece uma  ofensa tão dissonante quanto a própria palavra. Temos que chamar quem está morrendo de “paciente terminal”.

Mas o que é o paciente terminal? Seria alguém “irrecuperável”, aquele que apresenta uma situação clínica onde as medidas que possibilitem o resgate das condições de saúde são inócuas e/ou inexistentes. Além disso, a proximidade da morte se caracteriza como inevitável e relativamente previsível.

Antes de conhecer a expressão técnica, achava que “terminais” fossem os terminais de petróleo ou então os terminais de transporte urbano. Aqui mesmo em Fortaleza existem muitos. Esse termo está intimamente relacionado ao transporte, pois existem os terminais aéreos como sinônimos de aeroportos.

Mas esperem. Como posso dizer que uma pessoa seja “terminal” posto que isso não me diferencia dela? Sim, pois se terminalidade refere-se à condição de ser mortal, então sou igual ao paciente que está morrendo. Quem usa o rótulo sobre o outro na verdade pode se acondicionar com certo desconforto a terminologia que utiliza.  Mais, mesmo no âmbito da terminologia, um dia o rótulo lhe cairá adequadamente pois a saúde é um bem que escasseia com o passar do tempo.

Queria dividir com vocês uma história que ocorreu bem próximo de mim. Uma senhora de 93 anos vítima de um extenso AVC, matriarca de sua família, estava agonizando na UTI de um bom hospital numa cidade média  no interior de São Paulo. Tão amada quanto temida, ela era cercada pelos cuidados dos filhos até o fim. Mesmo num ambiente tão restrito quanto uma UTI, um dos filhos usava as prerrogativas de ser médico para ter seu salvo conduto para aquele reino tão fechado. E junto com ele, um a um, achegavam-se outros membros da família, seja para uma oração, seja para um breve olhar sobre o fim que parecia se aproximar rapidamente.

A maioria dos familiares morava numa cidade distante a 45 minutos de carro onde estava o hospital. Quase todos os dias eles se deslocavam para ver a “senhora terminal”, sim, ela era terminal já que estava cumprindo os requisitos técnicos para receber o rótulo. Num desses dias de ida e volta, o filho médico, alguém que se cuidava muito bem, que usava dos segredos da medicina para uma vida saudável, que tinha boa dieta e fazia atividade física rotineiramente, que no alto dos seus 56 anos parecia ter pelo menos 10 anos a menos; perde a direção do automóvel, com chuva fina e pista escorregadia, atravessa a outra mão da estrada e bate de frente num caminhão. Com ele morrem a mulher, um filho e dois netos.

Um  terrível clima de comoção tomou conta de todos como sempre acontece quando a morte resolve ser muito ativa em sua terrível colheita. Toda a família compareceu aos rituais fúnebres, todos atônitos, todos não sabendo direito o que fazer com tanta dor e como buscar energia para conforta-se uns aos outros. Todos compareceram, menos a matriarca de 93 anos, nossa paciente terminal que sobreviveu por mais 7 dias.

Ninguém deveria ser “paciente terminal”. Como nossa triste história conta, o rótulo é tecnicamente um tanto impreciso. TODOS SOMOS TERMINAIS, no sentido amplo da expressão já que todos morreremos. Mas usar o termo no campo da saúde parece ser uma espécie de licença para se matar mais depressa, seja de abandono, seja de descuido, seja pelo afã de se querer “salvar” expondo a pessoa aos mais terríveis rituais de tortura disfarçados em procedimentos médicos.

“Paciente Terminal” é a expressão que acompanha a frase infeliz, quando dizemos que “nada mais pode ser feito”. Chamar alguém de terminal acoberta o desconhecimento de que existem possibilidades de se continuar vivendo com intensidade e alegria. É o momento de tentar livrar-se das dores para podermos usufruir ainda mais algum tempo das belezas desse mundo,  e preparar-se para tudo que for necessário para a partida...não tão rápida que não permita realizar ainda alguns desejos; e nem tão lenta que permita a gente se cansar da vida.

É por isso que devemos substituir a expressão “terminal” para “paciente em vulnerabilidade extrema”. Todos somos vulneráveis à dor, ao sofrimento e à morte. Mas existem aqueles que vivem o extremo da vulnerabilidade. Para que um dia cuidem adequadamente de nós quando chegarmos a esse limite, é necessário mudar radicalmente a forma como lidamos com aqueles que oficialmente estão morrendo. Digo “oficialmente” porque, sabemos todos nós, nossa vulnerabilidade pode se tornar extrema a qualquer momento.

por Erasmo Ruiz


sexta-feira, 3 de maio de 2013

Para Francisco, (autoria  Cristiana Guerra ; editora: ARX)



Esse é O livro, com O maiúsculo e em negrito mesmo. Livro-relato, livro-vivência, livro-denúncia, livro escancarado da dor de uma mulher, grávida do seu primeiro filho - Francisco - e de seu luto pela perda do marido, falecido subitamente depois de um ataque cardíaco fulminante.
Ela começou a sua escrita elaborativa criando um blog. Fez sucesso, muito sucesso. Foi editado e virou um livro, que não dá para parar de ler. Passamos a acompanhar, a viver, a sentir, junto com Cristiana.
O relato é tão real que passamos também a sentir saudades do seu companheiro. Pesar por ele não estar mais aqui. 
Sentimos, especialmente, solidariedade à Francisco, que não irá conhecer esse pai, descrito tão amorosamente, por essa mãe, tão especial, potente e tão dolorida.
É relato de luto, de despedida, de pranto, de desamparo.
É relato da perda de um ser amado, do único sonho imaginado, do plano perfeito que seria vivido, mas que não foi.

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19 de setembro de 2007.

O nome da dor.

Eu tive pai e mãe. E os perdi cedo, conheço essa dor. Para mim, a perda do seu pai dói muito diferente. Ele não era de onde eu vinha. Era para onde eu ia.

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Cliquem no link abaixo e conheçam o blog criado pela autora do livro. 

http://parafrancisco.blogspot.com.br/

sábado, 27 de abril de 2013


"A solidão dos Moribundos" , livro de Norbert Elias, editado pela Jorge Zahar, edição de 2001. 
Esse livro é fantástico, especialmente, para quem ainda está na graduação e quer a indicação de um livro introdutório sobre os temas ligados aos cuidados de final de vida, finitude e morte.
Leitura gostosa, didática, informativa e escrita  brilhantemente pelo sociólogo Norbert Elias (1897-1990).
Comprem e estudem. Temos certeza que vão adorar!
Aqui vai uma prévia - só para dar um gostinho - do ponto 1 apresentado logo no início do livro. 

"Há varias maneiras de lidar com o fato de que todas as vidas, incluídas as das pessoas que amamos, têm um fim. O fim da vida humana, que chamamos de morte, pode ser mitologizado pela ideia de uma outra vida no Hades ou no Valhalla, no Inferno ou no Paraíso. Essa é a forma mais antiga e comum de os humanos enfrentarem a finitude da vida. Podemos tentar a ideia da morte afastando-a de nós tanto quanto possível - encobrindo e reprimindo a ideia indesejada - ou assumindo uma crença inabalável em nossa própria imortalidade - "os outros morrem, eu não." Há uma forte tendência nesse sentido nas sociedades avançadas de nossos dias. Finalmente, podemos encarar a morte como um fato de nossa existência; podemos ajustar nossas vidas, e particularmente nosso comportamento em relação às outras pessoas, à duração limitada de cada vida. Podemos considerar parte de nossa tarefa fazer com que o fim, a despedida dos seres humanos, quando chegar seja tão fácil e agradável quanto possível para os outros e para nós mesmos; e podemos nos colocar o problema de como realizar essa tarefa. Atualmente, essa é uma pergunta que só é feita de maneira clara por alguns médicos - no debate mais amplo da sociedade, a questão raramente se coloca.
     E isso não é só uma questão de fim eletivo da vida, do atestado de óbito e do caixão. Muitas pessoas morrem gradualmente; adoecem, envelhecem. As últimas horas são importantes, é claro. Mas muitas vezes a partida começa muito antes. A fragilidade dessas pessoas é muitas vezes suficiente para separar os que envelhecem dos vivos. Sua decadência as isola. Podem tornar-se menos sociáveis e seus sentimentos menos calorosos, sem que se extinga sua necessidade dos outros. Isso é o mais difícil - o isolamento tácito dos velhos e dos moribundos da comunidade dos vivos, o gradual esfriamento de suas relações com pessoas a que eram afeiçoadas, a separação em relação aos seres humanos em geral, tudo o que lhes dava sentido e segurança. Os anos de decadência são penosos não só para os que sofrem, mas também para os que são deixados só. O fato de que, sem que haja especial intenção, o isolamento precoce dos moribundos ocorra com mais frequência nas sociedade. É um testemunho das dificuldades que muitas pessoas têm em identificar-se com os velhos e moribundos.
     Sem dúvida, o espaço de identificação é mais amplo que em outras épocas. Não mais consideramos um entretenimento de domingo assistir a enforcamentos, esquartejamentos e suplícios na roda. Assistimos ao futebol, e não aos gladiadores na arena. Se comparados aos da Antiguidade, nossa identificação com outras pessoas e nosso compartilhamento de seus sofrimentos e morte aumentaram. Assistir a tigres e leões famintos devorando pessoas vivas pedaço a pedaço, ou a gladiadores, por astúcia e engano, mutuamente se ferindo e matando, dificilmente constituiria uma diversão para a qual nos prepararíamos com o mesmo prazer que os senadores ou o povo romano. Tudo indica que nenhum sentimento de identidade unia esses expectadores e aqueles que, na arena, lutavam por suas vidas. Como sabemos, os gladiadores saudavam o imperador ao entrar com as palavras "Morituri te salutant" (Os que vão morrer te saúdam). Porém, numa sociedade em que tivesse sido possível dizer isso, provavelmente não haveria gladiadores e imperadores. A possibilidade de se dizer isso aos dominadores - alguns dos quais hoje têm poder de vida e morte sobre um sem-número de seus semelhantes - requer uma desmitologização da morte mais ampla do que a que temos hoje, e uma consciência muito mais clara de que a espécie humana é uma comunidade de mortais e que que as pessoas necessitadas só podem esperar ajuda de outras pessoas. O problema social da morte é especialmente difícil de resolver porque os vivos acham difícil identificar-se com os moribundos.
        A morte é um problema dos vivos. Os mortos não têm problemas. Entre as muitas criaturas que morrem na Terra, a morte constituti um problema só para os seres humanos. Embora compartilhem o nascimento, a doença, a juventude, a maturidade e a velhice e a morte com os animais, apenas eles, dentre todos os vivos, sabem que morrerão; apenas eles podem prever seu próprio fim, estando cientes de que pode ocorrer a qualquer momento e tomando precauções especiais - como indivíduos e como grupos - para proteger-se contra a ameaça de aniquilação.
        Durante milênios essa foi uma função central de grupos humanos como tribos e Estados, permanecendo uma função importante até nossos dias. No entanto, entre as maiores ameaças aos humanos figuram os próprios humanos. Em nome do objetivo de se proteger da destruição, grupos de pessoas ameaçam outros grupos de pessoas de destruição. Desde os primeiros dias, sociedades formadas por seres humanos exibem as duas faces de Janus: pacificação para dentro, ameaça para fora. Também em outras espécies a importância da sobrevivência das sociedades encontrou expressão na formação de grupos e na adaptação dos indivíduos à vida comum como uma característica de sua existência. Mas, nesse caso, a adaptação à vida do grupo se baseia em formas geneticamente predeterminadas de conduta ou, na melhor das hipóteses, limita-se a pequenas variações aprendidas que alteram o comportamento inato. No caso dos seres humanos, o equilíbrio entre a adaptação aprendida e a não aprendida à vida em grupo foi revertido. Disposições inatas a uma vida com os outros requerem sua ativação pelo aprendizado - a disposição de falar, por exemplo, pelo aprendizado de uma língua. Os seres humanos não só podem, como devem aprender a regular sua conduta uns em relação aos outros em termos de limitações ou regras específicas à comunidade. Sem aprendizado, não são capazes de funcionar como indivíduos e membros do grupo. Em nenhuma outra espécie essa sintonia com a vida coletiva teve tão profunda influência sobre a forma e desenvolvimento do indivíduo como na espécie humana. Não só meios de comunicação ou padrões de coerção podem diferir de sociedade para sociedade, mas também a experiência da morte. Ela é variável e específica segundo os grupos; não importa quão natural e imutável possa parecer aos membros de cada sociedade particular: foi aprendida.
        Na verdade não é a morte, mas o conhecimento da morte que cria problemas para os seres humanos. Não devemos nos enganar: a mosca presa entre os dedos de uma pessoa luta tão convulsivamente quanto um ser humano entre as garras de um assassino, como se soubesse do perigo que corre. Mas os movimentos defensivos da mosca quando em perigo mortal são um dom não aprendido de sua espécie. Uma mãe macaca pode carregar sua cria morta durante certo tempo antes de largá-la em algum lugar e perdê-la. Nada sabe da morte, da de sua cria ou de sua própria. Os seres humanos sabem, e assim a morte se torna um problema para eles."